Cutwork italiano do século XVI |
Embora existam registros de trabalhos manuais como o bordado desde a antiguidade, o desenvolvimento da renda se deu a partir do século XV. Uma das primeiras técnicas para a sua produção consistia em bordar o tecido primeiramente e então recortá-lo em pontos estratégicos, formando um desenho vazado, conhecido em inglês como cutwork.
Assim que é desenvolvida a renda passa a aparecer no vestuário enfeitando roupas no lugar dos bordados ou complementando-os. Inicialmente, as principais técnicas eram a renda de agulha (que é feita a partir de um fio contínuo) e a de bilros (com os desenhos feitos a partir de vários fios). Os principais materiais utilizados inicialmente eram o linho, ouro e a seda.
Detalhe de Venus, from the Seven Planets and ages of men, de Adriaen Collaert |
Os primeiros países a desenvolverem esse tipo de renda são a França e Itália, mas a partir dos séculos XVI e XVII cada país desenvolve sua própria técnica para a produção de renda. Por exemplo, os conventos italianos eram os principais na produção de rendas de agulha. Já a Holanda tinha uma preferência maior pelas rendas que formavam os rufos. Alemanha e Inglaterra também eram grandes produtoras de na época. Desde o início, a produção de renda era muito associada às mulheres, que eram as principais responsáveis pelo desenvolvimento dos trabalhos manuais.
Punto in aria, que decoravam os rufos europeus no século XVI. Um único rufo poderia usar até 23 metros de renda. |
No século XVII temos uma preferência ainda maior por rendas, que decoram as golas e punhos das roupas, principalmente. O seu uso era comum tanto por homem quanto por mulheres. Por ter uma produção extremamente demorada e intrincada, era a parte mais cara do vestuário e utilizada principalmente pela aristocracia.
Detalhe de um retrato de George Villiers, o 1o duque de Buckingham |
A grande procura pelas rendas causou até mesmo o contrabando das mesmas, decorrente de proibições comerciais relacionadas à importação em países como a Inglaterra e a França. Existem vários registros no século XVIII de revistas de autoridades em procura de rendas contrabandeadas em casas, ateliês e até mesmo caixões!
A Guerra de Sucessão Espanhola (1702-1714) freou a produção de rendas em vários pontos dos países europeus, impactando a economia dos lugares em que a peça era uma commoditie importante, como a França. Após esse embate, a França voltou a utilizar as rendas na ornamentação dos vestidos e esse uso se manteve presente até o fim do século, quando ocorre a Revolução Francesa e a moda passa a ser mais simples, rejeitando ornamentos relacionados à nobreza.
As rendas então caem em desuso até o início do século XIX, quando Napoleão ascende ao poder e passa a adornar suas roupas com rendas, popularizando alguns tipos, como a renda d'Aleçon
Renda d'aleçon |
No Brasil, a chegada de D. João VI em 1808 aumentou a demanda pela produção de rendas por conta do maior número de eventos sociais, que influenciaram a elite a fazer uso de peças de roupas mais elaboradas. A importação de renda francesa também era muito comum, assim como revistas de moda, por onde mulheres da elite aprendiam as técnicas para produzir rendas manuais. O uso das rendas de bilros no país é antigo, mas não há muitos registros formais de quando ela passou a ser utilizada. O ensino das técnicas eram feito de forma informal, em casa, para as moças da família ou criadas.
Tear de renda industrial do século XIX |
Essa mudança impactou diretamente as mulheres que produziam rendas manuais, que tiverem seus empregos ameaçados e seus salários diminuídos. Em contrapartida, essa maior produção facilitou o acesso às rendas por classes menos abastadas.
No fim do século XIX popularizam-se as rendas químicas, que eram produzidas com uma técnica em que o motivo é bordado em um tecido que posteriormente é removido com processos químicos, deixando somente o desenho vazado.
Decote de renda vitoriano produzido a partir da técnica de renda química |
No início do século XX ocorre a Belle Époque, movimento artístico que impactou a moda europeia onde o uso de rendas era intenso no vestuário feminino. Após algumas décadas, ela é tida por fora de moda por alguns estilistas famosos e cai em desuso.
A produção das rendas manuais é impactada peça I e II Guerra mundial, as Guerras Civis Espanholas e a Crise Financeira de 1929, eventos que também tiraram muitas mulheres dos lares para assumirem postos no mercado de trabalho. A partir disso, a renda manual se torna mais um ofício mais raro, utilizado como lazer.
O século XX também traz as fibras sintéticas a partir da década de 1930s utilizados em teares como Raschel, que são utilizados até hoje na moda.
Renda do tipo raschel |
Espero que a leitura desse texto tenha despertado curiosidade acerca do assunto e que vocês tenham aprendido um pouco aqui. Pra quem quiser se aprofundar, recomendo fortemente os livros citados nas referências.
Fico à disposição para ler outras sugestões de temas pra coluna de história da moda aqui no blog, que outros assuntos você gostaria que eu abordasse nesse formato?
Até!
Principais referências:
Decifrando rendas, Vera Felippi
History of lace, Bury Palliser
Lace, a Sumptuous history, SFO Museum
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